terça-feira, 18 de outubro de 2011

A ESTRUTURA DO DRAMA: NOTAS MAIS OU MENOS BREVES, por Isaias Edson Sidney

(Romeu e Julieta)



Há pessoas, dramaturgos inclusive, que pensam que teatro é uma conversa em cima do palco. E escrevem peças como se fossem contos, romances etc. E fica tudo muito, muito aborrecido, chato mesmo. Ainda que o tema da peça ou a “história” da peça sejam comoventes, agradáveis de se ouvir, numa leitura, por exemplo.


Mas, aí já temos mais um engano: teatro não conta história ou histórias. Teatro tem ENREDO, TRAMAS, nunca uma historinha a ser lembrada. Vai-se ao teatro em busca do conhecimento, do conhecimento de uma personagem ou de várias personagens, de suas motivações interiores, de seus traumas, de sua razão de ser, enfim. Mas, disso podemos falar noutro momento. Agora, eu quero apenas deixar bem claros três elementos básicos que uma boa peça de teatro deve ter:




1. AÇÃO PRESENTE DE CENA: é aquilo que acontece no palco, diante de nossos olhos. A ação precede a palavra, ou seja, as personagens falam em função do que acontece e não o contrário. A ação mostra o que a personagem é, quem ela é, e não as palavras. Dizer que fulano é corajoso ou ele mesmo dizer-se corajoso, no teatro é nada! Tem que agir como corajoso, para que se conheça tal qualidade em tal personagem.



2. CONFLITO: é o que move o bom teatro. Sem conflito, o diálogo fica puxando diálogo, ou seja, cai no vazio, na entropia (perda de energia) e tudo fica muito crônico, muito contado. Mesmo no monólogo (peça de um só ator ou de uma só personagem, há sempre conflito: da personagem com ela mesma ou com o mundo, com qualquer outra coisa). Em todo bom diálogo de teatro, há um conflito – seja ele explícito, ou implícito. É isso o que segura o espectador na cadeira.





3. VERTICALIZAÇÃO: à medida que a personagem age, nós a conhecemos melhor. Ou seja, sua trajetória no palco deve nos levar a saber, a cada ação, as motivações interiores da personagem, seus conflitos internos, seu pensamento, seus ódios ou amores, sua visão diante da vida ou o porquê de estar essa personagem no palco, apresentando-se a nós.

Sem esses elementos, que são mais do que básicos no bom teatro, uma peça não pode pretender ter esse nome, seja ela drama ou comédia.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

ÉRICA MONTENEGRO ESCREVEU: SHAKESPEARE E O GLOBO




Shakespeare e o Globo


No verão europeu de 1595, William Shakespeare escreveu sua peça mais famosa: Romeu e Julieta. Londres recuperava-se da peste, mas enfrentava revoltas populares causadas pela alta nos preços dos alimentos. Além disso, James Burbage, líder da companhia The Chamberlain’s Man, da qual Shakespeare fazia parte, estava doente, e não se sabia até quando manteria o grupo.



A tragédia de amor entre filhos de famílias rivais traz muito do clima de violência e desesperança daquele momento. Segundo o biógrafo de Shakespeare, Park Honan, Romeu e Julieta fez (e faz) sucesso justamente porque fala de amor e violência. “A graça e o mal – ou o amor e o ódio – habitam todos os seres sensíveis e, portanto, coexistem em cada coração, em cada cidade”, diz.




(Ford Maddox Brown - Romeu e Julieta)

Quatro anos depois, a The Chamberlain’s Man inauguraria o Teatro Globo em Londres e levaria a ele Romeu e Julieta, peça que já havia agradado a nobres e populares no Teatro Curtain. Com o Globo, pela primeira vez atores e autores tornaram-se proprietários de uma sala de espetáculos. "Isso deu mais liberdade a eles, em relação aos custos e ao conteúdo das peças”, diz o professor de literatura Peter Harris, da Universidade Estadual Paulista.



A primeira vez de Romeu e Julieta

A famosa peça foi encenada durante o dia.

Farta Audiência




Não se sabe ao certo a data de estréia de peça, mas provavelmente foi em 1599. E sua platéia era diversificada. Nas galerias, sob um telhado de palha, estavam nobres e intelectuais. O povão (artesãos, comerciantes, prostitutas) ocupou a arena, sem cadeiras e a céu aberto. A peça foi encenada de dia, como de hábito.



Roteiro adaptado



A trama de filhos de famílias rivais que vivem um amor proibido em Verona não era original. Em 1562, o poeta Arthur Brooke contou em 3 020 versos a mesma história. A genialidade de Shakespeare foi transformá-la em uma ode contra a violência, enquanto Brooke escreveu um texto com fundo moralista.


Atriz (?) principal






A primeira Julieta era um homem: Edward Kynaston, que encarnaria esta e outras personagens femininas de Shakespeare. Na Inglaterra daquele tempo, mulheres não podiam participar de peças. A primeira vez que uma mulher subiu num palco inglês foi em 1660, quarenta e quatro anos após a morte do dramaturgo.




Ator coadjuvante




Além de escrever, Shakespeare interpretava papéis secundários em suas peças. Em Romeu e Julieta, viveu o frei Lourenço – o atrapalhado religioso que sugere que a heroína simule suicídio para escapar do casamento arranjado pela família. Mais tarde, ele teria tomado parte do coro, grupo que apresentava os atos da peça.



Cenário improvisado



Como em outras peças do dramaturgo, praticamente não se usaram cenários. Mas isto não limitou a criatividade do gênio. Na peça, as cenas se passaram em ritmo acelerado justamente porque prescindiram de trocas de cenário e figurino. Uma mesa no centro do palco foi suficiente para indicar o túmulo de Julieta.




Peça pirata


Na Inglaterra elisabetana,o sucesso de um autor era comprovado pela produção de cópias falsas de seus textos. Atores e pessoas da platéia escreviam de cabeça os diálogos – e as versões saíam cheias de erros. O primeiro Romeu e Julieta pirata saiu antes de o Globo ser inaugurado, em 1597.


Diversão garantida



Teatro comportava 3 mil pessoas



Com 3 andares, o Globo era uma opção acessível aos ricos e pobres: a entrada custava entre 1 e 3 pennies (1 e 5 centavos do nosso Real).



http://historia.abril.com.br/cultura/shakespeare-globo-434310.shtml

sábado, 5 de fevereiro de 2011

ELIANA IGLÉSIAS ESCREVEU: COMO ESCREVER PARA TEATRO


COMO ESCREVER PARA TEATRO

(Tsar Fyodor Ivanovich, de Tolstói, por Stanislavski, 1898)


A linguagem do teatro é completamente diferente da linguagem do cinema e TV.



Cinema e TV contam com o recurso das imagens.



O teatro é vivo, acontece naquele instante, naquele palco e sua linguagem é fundamentalmente a Ação.



Você pode ser um autor teatral (aquele que tem uma idéia própria a respeito do mundo e das relações humanas) ou dramaturgo (aquele que conhece a técnica de escrever para teatro) ou ambos (que é a melhor forma).





REGRAS BÁSICAS





Idéia Central.



Você deve ter uma Idéia Central para a sua peça. Idéia Central significa: exatamente o quê você quer dizer para o seu público?



Ex: Arthur Miller quando escreveu a peça “A morte do caixeiro viajante” quis passar a idéia de que a tecnologia moderna substitui a experiência do velho trabalhador. Os homens vão sendo colocados de lado, substituídos por máquinas.



Ação Presente de Cena.



É a Ação que deve haver em cada Cena. É através da Ação dos meus personagens que consigo mostrar minha Idéia Central ao público. Ao contrário do que se pensa, no teatro, a Ação vem antes dos diálogos. É a Ação que gera o diálogo e nunca o contrário. Senão, a peça perde o interesse da platéia.



A Ação dos Personagens não pode ser uma Ação Vulgar.



Exemplo: Abrir uma garrafa de vinho e beber o vinho, simplesmente por beber.



O ato de beber o vinho deve ser ligado à Idéia Central da peça.



Se pensarmos na Idéia Central “Os homens são substituídos por máquinas”, ao abrir uma garrafa de vinho, meu personagem, por exemplo, pode referir que as uvas daquele vinho já não são amassadas por pés humanos, e sim por máquinas. E ele bebe por quê? Para brindar a vitória da tecnologia ou a derrota dos homens?



Protagonista.



É ele quem vai carregar e defender sua Idéia Central até o desfecho da peça.



Como se reconhece um protagonista? Você reconhece o protagonista porque ele é quem muda mais de qualidade durante toda a peça.



Novamente o exemplo “O homem x máquina”: O homem é demitido pelo chefe porque uma máquina fará o seu trabalho daí para frente. Numa cena você pode mostrar o seu protagonista derrotado, completamente sem esperanças, comunicando o fato à sua esposa. Noutra cena você pode colocar seu protagonista reagindo, lutando com todas as forças para conseguir seu emprego de volta. Na cena de crise, por exemplo, ele enlouquece e trava um duelo com a máquina, como D. Quixote, e acaba sendo tragado e morto pela máquina.



Antagonista.



É o personagem que se contrapõe às idéias e vontades do seu protagonista, gerando então o Conflito.



Conflito.



É essencial a toda peça e a cada cena que está sendo apresentada. É o conflito que faz a peça caminhar para frente até o seu desfecho. O conflito essencial é mostrado na Cena de Crise.



Cena de Crise.



É a principal cena da peça, porque nela os personagens se mostram por inteiro. Numa boa peça você vai conhecendo, a cada cena, novas facetas de personalidade de seus personagens. Quando chega na Cena de Crise, o público já deve conhecer o suficiente sobre cada personagem para que haja uma identificação e uma emoção específica.



Rubricas desnecessárias.



Nunca se deve pôr rubricas do tipo: John ( Muito ansioso) ou Mary (Com ar de cansaço). É tarefa do ator (e do diretor) descobrir a emoção contida em cada fala de seu personagem.



Rubricas de Direção.



Também são desnecessárias rubricas como: O ator deve andar até o proscênio, virar-se para o lado esquerdo da platéia e dizer bla bla bla. Isso é tarefa do diretor.







Questões para pensar 


(antes de começar a escrever)




1. Shakespeare colocava nos primeiros sete minutos de suas peças o conflito essencial. Ex: Em Hamlet, o fantasma de seu pai assassinado por seu tio e pela própria mãe aparece e clama por vingança. Você concorda que os 7 primeiros minutos são essenciais para provocar o interesse ou distanciamento da platéia?



2. O quê, na sua opinião, seria uma boa Idéia nos dias de hoje, para passar para uma platéia?



3. Você já se interessou por algum tipo de linguagem de comunicação, como escrever para teatro, cinema ou TV? Acha que é algo intuitivo ou necessita de técnica?




sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

AÇÃO PRESENTE DE CENA, por Isaias Edson Sidney

(Teatro del Príncipe - Espanha)

Define-se o teatro pela ação.


Sem ação, não há teatro.

Na literatura – romance, conto, poema épico etc. – a palavra carrega a ação. Conta-se. Reconta-se.

Já no teatro, a ação precede a palavra. As pesonagens agem e depois falam, ou só falam em função de alguma ação, a partir de algum acontecimento.

Esse princípio básico do teatro – a ação – é, talvez, o mais simples de ser explicado e o mais difícil de ser realizado.

Porque teatro não se constitui de pessoas falando/conversando no palco, mas de personagens agindo, no palco. Não exatamente se movimentando, porque movimento e ação são coisas totalmente diferentes.

No solilóquio famoso de Shakespeare – “ser ou não ser” – o ator não precisa mover um só músculo além dos lábios, mas há uma enorme ação (neste caso, interior) presente de cena, resultado da tensão emocional de Hamlet, de seu estado de ânimo, de suas contradições, dúvidas e reflexões acerca de tudo o que lhe aconteceu até então: a morte do pai, a busca do assassino etc.

Um ator/personagem, com uma carta na mão, andando de um lado para o outro não nos diz absolutamente nada. Não é teatro.

Um ator/personagem que nos conta haver recebido uma carta com más notícias já tem um pouco de ação. Mas ainda não é teatro, é só alguém contando o que aconteceu.

Porém, se vemos o ator/personagem receber uma carta, abri-la nervosamente, lê-la (mesmo que silenciosamente) e sua expressão se modificando até um grito de dor ou de qualquer outro sentimento, aí já temos teatro. Porque temos ação. E o que ele disser a partir disso tem uma verdade, porque consequência do fato de haver recebido uma carta com alguma notícia importante.

Hamlet não nos conta suas dúvidas, temores e apreensões: ele se apresenta diante de nós, naquele momento, com suas dúvidas, temores e apreensões. E nos toca, ao falar de sentimentos que ele está vivendo naquele instante. Um grande momento do teatro – e da grande ação teatral – sem dúvida nenhuma.

Portanto, ação presente de cena é aquilo que acontece naquele exato momento no palco, durante a representação teatral, diante de nossos olhos. E normalmente, a ação é resultado de um conflito, de forças que se entrechocam.

Mas do conflito – outro pilar do drama/teatro - falaremos em outra ocasião..

Por enquanto, é preciso ficar muito claro que, no drama, ou seja no teatro, a ação é o elemento que não deixa uma peça entrar em entropia, ficar chata, desagradável, cansativa.

Ao escrever suas peças, o dramaturgo – o bom dramaturgo – pensa primeiro nas ações e depois nas palavras. E entende-se bem esse conceito, relendo-se o texto de Aristóteles, já publicado neste blog. E lendo – lendo muito – autores como Shakespeare (claro), mas também Tennesse Williams, Harold Pinter, Strindberg, Brecht e muitos outros, além dos trágicos gregos.