O Teatro do Oprimido é teatro na acepção mais arcaica da palavra: todos os seres humanos são actores, porque agem, e espectadores, porque observam. Somos todos espect-actores. (…) Creio que o teatro deve trazer felicidade, deve ajudar-nos a conhecermos melhor a nós mesmos e ao nosso tempo. O nosso desejo é o de melhor conhecer o mundo que habitamos, para que possamos transformá-lo da melhor maneira. O teatro é uma forma de conhecimento e deve ser também um meio de transformar a sociedade. Pode nos ajudar a construir o futuro, em vez de mansamente esperarmos por ele.
Augusto Boal, in Jogos para atores e não atores
O Teatro do Oprimido (TO) é uma metodologia de trabalho político, social e artístico e é um género teatral criado por Augusto Boal, encenador, dramaturgo e teatrólogo brasileiro. Bebendo as suas influências quer numa análise crítica sobre a evolução histórica do teatro, quer nos métodos pedagógicos de Paulo Freire, o TO propõe toda uma nova forma teatral que assenta na abolição da relação tradicional espectador/actor, para colocar no centro da prática dramática o espect-actor – não mais o espectador passivo, mas um interveniente na cena teatral. A base do TO é a exploração de situações de opressão e a valorização da capacidade criadora e criativa de todas as pessoas, em particular dos oprimidos. Isto acontece porque, depois do problema apresentado (uma pergunta ao público, sob a forma de teatro), os espect-actores podem substituir as personagens oprimidas e podem mudar a história, não apenas sugerindo como devia ser, mas actuando e confrontando-se com as outras personagens.
No Teatro Legislativo, exploramos uma história concreta que exprime um problema. Identificam-se os conflitos que estão em jogo e os obstáculos à resolução da situação. Esses obstáculos podem ser variados: pode ser um comportamento individual ou colectivo, pode ser uma relação de poder e pode ser uma lei ou um conjunto de leis que impede as pessoas de acederem aos seus direitos ou que consagra uma relação injusta, de desigualdade, de opressão ou de exploração. O Teatro Legislativo é a utilização da metodologia do Teatro do Oprimido para mudar a lei, discutindo as alterações necessárias às leis que existem a partir de histórias concretas, mas também testando as formas de organização colectiva que são necessárias para construir uma relação de forças diferentes que imponha uma lei mais justa.
O Teatro Legislativo é uma forma de humanizar a política: quando temos pessoas concretas e com nome à nossa frente, sabemos que a violência, o desemprego, a discriminação, são marcas reais em corpos verdadeiros, e não apenas conceitos abstractos para discursos inflamados. O Teatro Oprimido – e, dentro dele, um projecto de Teatro Legislativo – é uma das formas possíveis de democratizar a política: ele não requer que as pessoas possuam qualquer linguagem técnica (o que muita gente chama por vezes da “linguagem dos políticos”) para se exprimirem. Ele impele as pessoas a falarem da sua vida através da sua própria presença – corpo, voz, movimento – e facilita por isso a expressão das pessoas num código que não as põe à partida em desvantagem, relegando-as para a categoria de “incompetentes políticos”, mas que as reconhece como as mais competentes na expressão da sua realidade. Por último, o Teatro do Oprimido (e, dentro dele, o Teatro Legislativo) é uma forma activa, entusiasmante e envolvente de discutir política porque despoleta o debate a partir da humanização da discussão e de uma história concreta. Desinstitucionaliza o debate político e abre novos espaços de conflito e de alternativas.
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